Clube da Dona Menô
Dona Menô
Roberto Carlos em carne e osso
(o Nobel em caracóis)

Ontem, quando fui para uma cirurgia, uma amiga comentou que não gostava de Roberto Carlos. Estávamos na sala dos médicos e víamos na TV uma propaganda de algum evento do qual ele vai participar.

A única coisa que pude dizer foi que é impossível não aceitar o valor de Roberto como cantor e como figura humana. Se pararmos para pensar, ele cantou e canta músicas eternas, que ficarão para sempre em nossa memória. Músicas que são interpretadas por outros artistas, mas que ficarão eternamente assinadas com sua voz.

Não existe no Brasil quem faça frente a Roberto. Ele consegue atravessar as décadas com seu público fiel, como também consegue estar presente na vida de todos, independentemente de idade, credo, posição política ou qualquer categoria.

Michael Jackson, que morreu dias atrás, teve seu auge e estava decaindo moral e financeiramente, apesar de ter sido sempre um excelente artista, com uma performance maravilhosa em palco e nos vídeos-clipe. Também não podemos negar que ele sempre ajudou pessoas carentes. Se ele era pedófilo, Deus agora acolhe sua alma para ser resgatada em vidas posteriores. Se não o foi, vai-se uma alma sofrida e revoltada, angustiada, injustiçada.

O que há de semelhança entre Roberto e Michael? Acho que nada, e por isso mesmo estou escrevendo! Roberto Carlos foi acusado de ser alheio politicamente, de não ter se envolvido com lutas disso ou daquilo, que é supersticioso, excêntrico, neurótico, principalmente por não aparecer nunca nos ambientes dos socialites e da vez, por odiar a cor marrom, por não falar palavras negativas, por usar talheres pessoais em restaurantes, e coisa e tal... Ora bolas... Conheço pelo menos meia dúzia de gente que é bem mais “písica” que isso e todo mundo acha que são pessoas “extraordinárias”...

A única vez que li algo contra ele, e que realmente me deixou encafifada, foi quando disseram que ele “atravessou” contrabando - coisas para seu barquinho, eu acho... A notícia morreu por ali mesmo e ninguém deu a menor bola.

Gostei de assistir a uma entrevista que ele deu para o programa do Jô, há alguns anos. Ele dizia que atrasou um espetáculo porque estava cuidando de um louva-deus ou uma libélula com asa quebrada, não lembro. Achei exótico e muito profundo, pois um artista vê e sente diferente dos outros humanos.

Para mim ele é um docinho, uma pessoinha muito linda, tendo um bom caráter e boas condutas,. Ele passa coisas positivas e de valor moral. O Brasil deve se sentir orgulhoso por ter um representante de seu nome em tão alto conceito, o que não ocorre com facilidade por aí, quando valorizam atletas e artistas que são um zero à esquerda no que diz respeito à dignidade.
O que me surpreendeu foi Roberto sair da toca para aparecer no programa de Luciano Huck (em pleno meio de ano, nem é o tradicional musical de Natal!!). E também fazer “ponta” na “Grande Família”, e estar divulgando na TV (que não vejo quase nunca) seus shows num navio aí.

Os 50 anos de carreira de Roberto estão sendo brindados em carne e osso, pois ele está pisando mais firme no chão, o seu chão, o chão de seu país, e está ficando mais acessível, mais “normal”, mais povão. Só falta ele aparecer num comercial de absorvente íntimo. Aí, sim, eu ia pra galera e surtava de tanta felicidade. Ele devia fazer isso só de chinfra, pra zoar.

Um dia Roberto vai morrer, todos nós morreremos. Todos nós ficaremos doentes ou sofreremos algum acidente que irá nos deletar dessa vida. Roberto será lembrado para sempre, o que não acontecerá com mais da metade dos artistas que hoje em dia enchem de músicas imbecis nossas rádios.

Lembro que em meu vestibular para ingressar na faculdade de medicina, na prova de português, eu tive que interpretar a letra da música “Debaixo dos caracóis de seus cabelos”. Até hoje uma das mais lindas canções que ele interpretou, que tem autoria dele e de Erasmo Carlos, seu leal parceiro.

Não se pode desvincular Roberto de Erasmo, que sempre será o esteio, a sombra divina, o carisma, o amigo e o motor do que é hoje este REI.

Roberto é REI por ser bom, humilde e inteligente. Ninguém conseguiria sobreviver a tantas décadas sem inteligência. Mas eu acho que, além disso, ele tem uma estrela muito brilhante. Esta estrela o iluminou ao longo da vida, em tantas tragédias, onde ele foi o ator principal ou adjuvante, e onde ele recebeu o Nobel de Deus.

Roberto sempre será lindo, respeitado e admirado. Não sou fanzoca dele, entretanto. Eu sou, sim, alguém que consegue entender que ele fez e faz parte de nossas vidas e nossa cultura – a cultura que devemos realmente valorizar.

Leila Marinho Lage
Rio, 3 de julho de 2009