Clube da Dona Menô
Dona Menô

Perda

Perdi um comprovante para o imposto de renda
Um papel que resumiria horas de trabalho
e agora me rende dor de cabeça...
Sento e desisto.
Não tenho a mesma memória como parceira,
minha sentinela.
Resolvi fechar os olhos, ficar pelada.
Sem lenço, documento ou qualquer semelhança
com uma criança.
Sou mais um guri.
A não ser pelo olhar
atrás das olheiras.
Olhar de esperança,
mesmo sem nada esperar;
este olhar frenético
existirá até minha morte,
pois é genético.
Não posso pintá-lo em meu rosto,
apenas pinto ao redor.
Retoco marcas de desgosto.
A maquiagem não fica melhor...
Perdi tanto.
Perdi um teto, dois tetos
e ainda perderei outros.
Mas, como nossa final e eterna morada é no chão,
não vai ser sacrifício nenhum
perder o que fica acima de mim em vão.
Perdi a foto,
perdi a festa,
perdi o show,
porque no dia eu estava triste.
Perdi o almoço,
e, portanto, perdi o encontro.
Perdi tempo.
Perdi pessoas
e com pessoas,
mas não me perdi na minha intenção.
Perdi dinheiro,
ou melhor, não o ganhei.
Perdi o papel onde desenhei
viagens que não programei
- pra fora,
porque pra dentro,
sempre me visitei.
Perdi o oportuno.
Perdi meu mundo,
perdi a graça...
O tesão por certas coisas?
Perdi com o imposto...
Perco nomes, endereços,
perco-me em adereços.
Perdi o fio da meada,
perdi a piada.
Vivo perdida,
perdendo a entrada.
A saída?
Dá pra saber?
Nesta ainda não vi nada.
De tanta perda em minha vida,
não consigo entender
como me chamam de rica.


Leila Marinho Lage
http://www.clubedadonameno.com