Clube da Dona Menô
Dona Menô

Emoticon
Nossa! Como era grande...

Até bem pouco tempo atrás, eu nem sabia ligar um computador. Sempre tive quem fizesse as coisas para mim e, mesmo sabendo a falta que um pc faz e tudo o que ele pode nos proporcionar, não havia espaço em minha vida para ele.
 
Como escrevo, agora ele é uma mão na roda para meus sonhos.

Um amigo sempre me alertou: “Olha, você não é ninguém se não conhecer o mundo virtual”.

Ele pensava que eu tinha fobia por isso. De jeito nenhum! Sou agitada, metódica, ansiosa, taquipsíquica, mas não me acho burrinha. Um pouco atrapalhada, talvez. Admirava quem sabia dominar aquele que era para mim um monstro, mas não o odiava. Só não tinha oportunidade como as pessoas normais. Nunca fui normal mesmo...

Com as portas abertas para o mundo, a gente começa a brincar com a Net e através dela. Já passei poucas e boas aqui neste mundo novo, com seus recursos e suas precariedades.
 
Isso de o computador ser burro eu não acredito!!! Por exemplo: O bichinho do Word é meu amigo e, quando escrevo algo triste, ele me olha com carinho; fica feliz, quando eu consigo me expressar devidamente; e me questiona o tempo todo sobre minhas certezas.

Vários amigos me ajudam a vencer meus dramas e, com certeza, a convivência com estas pessoas pelo Messenger me tirou várias vezes de enormes depressões.
 
Uma amiga em especial foi importante na minha tarefa de usar os recursos que tinha em mãos, sem saber usar. Por bem ou por mal...

Por que? Bem, aí eu tenho que contar o ocorrido:

Eu teclava com esta amiga e um alemão. Conversávamos em três nesta maquininha de fazer doidos. Ele lá na Europa e a gente aqui no Brasil.

Esta amiga saca pra caramba de inglês e alemão e conhece bem a Europa. Muito elegante, circunspecta, séria, educada, gentil, um doce de gente. Jamais de sua boca sairá um palavrão, por exemplo. Nem sei como conseguimos tanta amizade se somos tão diferentes. Deve ser essa coisa de opostos que se atraem...

O amigo alemão: um homem maduro, muitíssimo culto, poliglota, entendedor das coisas que um simples mortal não tem a menor capacidade de conhecer.
 
Achei uma ótima idéia unir os dois e travarmos um papo bem cult (porque Messenger também é cultura). Até corrijo os trabalhos da escola de um amiguinho sulista de 15 anos!...

E começaram, ela e o alemão, a falar sobre as montanhas branquinhas não sei o nome, do hotel não sei das quantas, do restaurante não de quê. Eu, literalmente, viajava, mas não sei pra onde...

Ela, para piorar, começou a teclar em alemão, para se fazer entender melhor. Como eu não entendia patavinas, pegou pra mim.
 
Se, pelo menos, fosse em inglês, dava para acompanhar aquele papo, mas, com um monte de sílabas juntas, sem vogal nenhuma, tremas e quilométricas palavras, nosso latim não me ajudou em nadica de nada.

Eu decidi brincar, não sei pra quê...

Brincar é a minha terapia. Faz a gente voltar a ser criança e achar o que de mais puro ficou pra trás. Se me virem muito séria e calma, é porque estou realmente à beira de um ataque de nervos. Brinco até com a desgraça. Ah, se não fosse assim...

Tenho uns sobrinhos, que, de tanto estudarem, ficaram meio lesados ou, vai ver, é da genética da gente mesmo. Mandaram emoticons pra mim (para mim eram novidades). 

Para quem ainda não sabe, “emoticons” são aqueles ícones ilustrativos, que podem ser letras ou figuras. A palavra é a contração de emotion (emoção) com icon (ícone). Eu colecionava um monte destes de sacanagem - casal trepando, genitálias de todos os tipos, essas maravilhas virtuais...
 
Que é que tem?! Você também não tem as suas "taras"?
 
Eu guardava todos os meus emoticons com carinho, mas não tive o cuidado de os renomear. Esse foi o meu pecado.

Naquela tarde tão inocente, com os meus dois amigos on line, acrescentando cultura geral à minha cabecinha tolhida, comecei a teclar aleatoriamente e a enviar para eles, através de minha janela, palavras inexistentes (gdhdrçyçiu..gg), enquanto eles se controlavam para não me mandar pro inferno.
 
Já imaginaram, não é? Pois, foi. Um enorme pênis acordou do ostracismo dos meus arquivos e levantou, satisfeito, através da nossa janela de diálogo.
 
Instintivamente, eu pulei da minha cadeira para tentar segurar aquele pássaro genital, que fugia, fugia...

Não sei o que os meus amigos conversavam, mas, ao verem o meu penisinho, tão feliz, subindo e subindo, calaram no mais sepulcral silêncio.
 
Não se lia nada. Foi assim por uns 3 minutos. Ninguém ousava falar.

Três minutos no Messenger é uma eternidade. A gente, com o tempo, vai aprendendo a linguagem virtual e suas sutilezas: como escrever, como brigar, fazer as pazes, mostrar seus sentimentos, calar-se no que não se pode fazer entender.
 
E naquela situação? Como eu deveria fazer? Alguém neste mundo já deu um órgão genital de presente sem querer?
 
Gelei.

Comecei: “Oi, tudo bem? Vocês ainda estão aí? Posso explicar? Adianta explicação, heim?".

Tentei resumir como aconteceu aquela desgraça. A Alemanha fora destruída, mais uma vez, agora, por umas pequenas letras desconexas, como, talvez, “ccte”, ou “paau”, ou sei lá como estava nomeado o meu desenhinho animado.
 
A minha amiga me desculpou, mas imaginei o seu choque. Creio que, naquela hora, ela tenha caído pra trás ou ficou branca como a tela.

Ânimos apaziguados, eu saí intacta da minha falta de atenção e cuidado.

Para evitar reincidências, deletei todos os emoticons perigosos, mas depois pedi tudo de volta e os renomeei entre parênteses.

Constatei que todos os amigos e parentes me enviaram emoticons além dos que eu tinha antes. Cada coisa!

Pô! Deixa eu ter meus brinquedos! Todo mundo tem!
 
E o alemão?!
 
Eu disse que era da paz, que não foi por mal, etc, etc. Ele concordou e disse que admirava muito a comunhão – inclusive dos corpos.

Tá me pedindo em casamento...

Leila Marinho Lage
Rio, 10 de outubro de 2005