Clube da Dona Menô
Dona Menô

 

 Rio Antigo - A feira


Esta minha amiga Eliana Rocha é “felomenal”... Como ela estuda história, deixei na sua incumbência roer o osso duro, ou seja: escrever sobre a história do Rio de Janeiro, principalmente do Centro da Cidade e a feira do Rio Antigo, que acontece todo primeiro sábado de cada mês. Ela é que entende de Centro da Cidade – sabe todas as ruas, os monumentos, aonde vende isso ou aquilo, os melhores bares e restaurantes, a boemia.
Ah, a boemia... É uma pena... Tanto meu ex-marido quanto os namorados seguintes só me levaram pra churrascaria e self-services! Agora estou mudando isso aos poucos...

De Centro da Cidade, então, eu tenho (tinha) a maior ojeriza: multidões nas ruas, aquele cheiro de mijo no ar, assaltos, trombadinhas, corre-corre, aquele calor infernal, gente suada passando o sovaco na minha cabeça (sou baixinha). Fora que de Centro da Cidade eu só conheço onde é a Santa Casa, Beneficência Espanhola e Portuguesa; que é caminho para a Clínica Peri-Natal, Casa de Saúde São José, etc, etc, etc...
Sempre adorei conhecer coisas típicas, brincar, fotografar, conhecer gente diferente, admirar coisas belas aonde ninguém se toca. Mas, as crianças cresceram, menos eu...

Eliana e eu, de certa forma, nos complementamos. Não que eu seja diferente dela. Aí é que está o barato da coisa: eu e ela nos adaptamos às situações. Não existe aquela quietinha, aquela rabugenta, nada. Apenas nos entendemos. Não existe na nossa amizade nenhuma competição, disputa de egos, nada - só companheirismo e empatia. Somos pessoas simples, sem frescura. Já passamos um bocado por esta vida para nos dar ao luxo de passearmos por aí falando bobagens, rindo, vendo a vida em outros ângulos.
A gente badala bem. Não comemos ninguém, é verdade, mas badalamos... Ela deixa o marido em casa, guardado, e eu dispenso os “self-services” para curtirmos as coisas boas da vida.
Assim foi a nossa visita à feira do Rio Antigo, que foi a segunda vez que fui. A primeira eu fui acompanhada de meu sobrinho, um mês antes,quando ele me convidou pra passar a tarde conhecendo os trechos exóticos do centro, e a pé!

Eu adoro andar, mas, naquele dia, estava de salto alto e ele me mandava correr, atravessar ruas, entrar em becos escuros, sempre procurando alguma coisa. Durante o dia é maravilhoso. A segurança existe, apesar de eu não ter observado muitos guardas. Talvez, pelo menos na área da feira, a segurança esteja à paisana, observando os turistas, moradores e comerciantes. Percebi que os menores de rua e os mendigos somem para as ruas adjacentes ao movimento, entre as estátuas e monumentos. Quem passa na Rua do Lavradio, na Cinelândia, nos arcos da Lapa (antiga construção que era o aqueduto da cidade) não verá tanta violência ou prostituição, como se via até bem poucos anos, nem de noite.

O Rio de Janeiro descobriu que o turismo depende de segurança e que a renda que se perde por causa da miséria só trará mais miséria a esta Cidade. Infelizmente, as crianças abandonadas ao destino das ruas e os pobres alcoolizados, que dormem no chão, voltam a popular estes lugares depois que os visitantes se vão, e a maioria fecha os olhos para isto.
Minha visita ao Centro foi feita nos dias 1 de setembro e 6 de outubro de 2007 e muita coisa deixei de ver (apesar de já conhecer), como é o caso da Confeitaria Colombo, tradicional casa de chá e restaurante, e que vale uma crônica só pra ela. Futuramente vou contar histórias muito legais sobre o Centro Cultural do Banco do Brasil, uma construção maravilhosa da época do Império, que é reduto de grandes exposições artísticas,cinema, teatros, casa de chá, e, obviamente banco – talvez um dos lugares mais bonitos que eu já vi no Rio de Janeiro. Do ladinho está a Casa França- Brasil, também outro canto de eventos culturais.
O antigo se mistura ao moderno. Vemos fachadas e prédios lindíssimos engolidos por construções mais modernas, pelo lixo, e pelo desrespeito à nossa cultura. Eu acho uma sacanagem tombarem um prédio como patrimônio histórico (portanto, não pode ser demolido) e ninguém o reformar ou conservar! Graças a Deus, aos poucos, isso está mudando. É uma pena a gente ver casas lindas, com detalhes em rococó, art nouveau, art decô, art de não sei o quê, tudo sujo, cinza, descascado e pixado pelos pivetes. Existem portões, igrejas, belos recantos, além de áreas verdes, que eu e Eliana teríamos que desmembrar cada lugar em crônicas separadas. Talvez até o façamos.

Voltemos ao dia do nosso passeio. Sim, Eliana é comodista, odeia andar. Ela tem que parar, observar, viajar mentalmente. É a nossa grande diferença: ela é zen e eu, elétrica. Ela acha que tem tempo pra tudo e eu acho que tudo tem que ter sido feito ontem. Ela me faz perder muito tempo... Mas, certamente, está me ensinando a tirar proveito de momentos, como foi o caso do almoço que tivemos.
Eu, querendo ir pra feira e ela com fome; eu de dieta e ela querendo comer todas. Então, eu me rendi e decidi comer bife com batata frita. Isso mesmo. Um belo bifão com arroz e todas as frituras possíveis e imagináveis. Se for pra comer tem que comer direito, não é?
Por causa desta loucura, não emagreci uma grama naquele final de semana, mas comi o melhor bife da cidade no restaurante do Aires.

Dizendo assim, até parece que Aires é nosso amigo antigo... Conhecemos naquele momento, conversando com a amiga de Eliana, a baixinha... Eu não sei se Aires é alto – só sei que Conceição é baixa... Como sou baixa também, qualquer um é alto. Mas, realmente verifiquei que ele se baixava demais pra me perguntar porque eu não escolhia um prato mais elaborado para comer, afinal, quem sai pra almoçar, quer comer algo diferente. Falei que o diferente, para quem está comendo alface e rúcula todo dia, é BATATA FRITA E BIFE!
Lá foi o dono do Nova Capela e do Rio Coa nos acompanhar no almoço. A certa hora, já estávamos íntimos e, entre batatinhas, ovo frito e um feijãozinho esperto, num lugar muito agradável, a gente conquistou o nosso mais recente melhor amigo. Vou voltar lá pra comer, quem sabe, purê de batatas com carne moída. Isso deve enlouquecer qualquer chef...

Eliana acertou no que disse. Eu queria ir para fotografar, não para comprar. Não adiantaria mesmo! Tudo me dava sonho de consumo: as máscaras, os móveis marchetados, os utensílios de décadas anteriores, os objetos de navio, rádios antigos, pratos de parede, vasos de Murano, bem estilo dos anos 50 e 60 – tudo exposto na rua fora das muitas lojas e em barraquinhas de ambulantes. Mas, que me deixou louca mesmo foi um espelho veneziano. Tenho um, mas colocaria um em cada canto da casa, até no banheiro. Adoro decoração. O meu problema é não ter “espaço” – espaço no bolso pra guardar grana pra isso...

Fiquei direcionada a comprar uns óculos pra Dona Menô, ex- hippie, agora na menopausa, a personagem do meu site. Pensando bem, esta figura tem muito da Eliana Rocha – irreverente, despachada, corajosa, sem papas na língua, alegre, e, ao mesmo tempo, com maturidade e muito juízo na cabeça.
Enquanto ela brigava com um garçom, no meio da rua, numa mesinha, pra provar
que não era turista, eu observava o seu sotaque fortemente carioca: “Qual é, mermão. Tá me achando com cara de gringa?! Que roubo é este nesta merda de cerveja?!”.
Também, pudera! Com cabelo vermelho, brancona e olho azul, ela não combina com a carioquice que possui. E pensar que eu viajei com esta moça para uma praia... Ela odeia praia! E eu, odeio frio! Pois é, temos que nos adaptar uma à outra...

Três coisas ficaram marcadas neste passeio e vou deixar para os próximos capítulos: os artistas, os arredores da feira e os monumentos.
Pulando para o final, no retorno às nossas casas, Eliana resolve parar num ponto de táxi. Ela olha para os motoristas fora dos carros e começa a brincar com eles. Todos abriram um sorrido largo. Eliana já foi motorista de táxi também. Quanta coisa esta mulher deve ter aprendido por aí...

Aí, vocês me perguntam: Como eu conheci esta figura rara?.
Bem ela me conhecia, mas eu nunca tinha prestado atenção nela. Fiz o parto de sua filha e ela, provavelmente, me via como uma pessoa rígida profissionalmente, nada mansa. Um dia, ela se cadastrou no meu site e começou a me ler e a se corresponder comigo. E eu comecei a conhecer o seu Blog e seus
textos. Tivemos a primeira parceria nos artigos que eu fiz sobre Goiás, quando ela contribuiu bastante, colhendo dados atuais para meus textos. Papo vai, papo vem, a gente descobriu muita coisa em comum – ou nem tanto... Não podia imaginar quem ela era, mas, dali, até se fazer uma grande amizade, foi um passo.

Leila Marinho Lage
Rio de Janeiro, 13 de outubro de 2007
E beijos da Dona Menô!