Clube da Dona Menô
Dona Menô

O SUSTO
 


Minha mãe esteve comigo, junto de nós, fotógrafos e simpatizantes, naquela sexta-feira do dia 9 de julho de 2010, lá em São Cristóvão. Aliás, São Cristóvão é um bairro muito familiar para mim, pois eu e meus irmãos estudamos no Colégio Brasileiro, lá pertinho da Quinta, e temos - todos nós três - lembranças de nossa infância e adolescência associadas com o lugar.
 
Minha mãe nos levava todos os dias de carro para a escola, e isso aconteceu até quando éramos bem grandinhos. Antes éramos transportados por uma caminhonete, mas como a grana ficava curta e como as contingências da vida ensinaram minha mãe a dirigir um carro, ela adorou a coisa e fazia questão de nos locomover com seu fusquinha vermelho - e ai de nós se negássemos!


Foto de Luiz G. Martins

Minha mãe ficou paralítica ao final da vida, por atrofia muscular, de tão fraca que estava com dois cânceres e insuficiência cardíaca. Por anos eu vivi num home-care. Jamais ela teve escara, nem mesmo assaduras, muito nenos infecção urinária. Isso demandou extremos cuidados, cuidados a cada minuto - da vida dela e da minha. Minha mãe era perfumada e limpíssima até num CTI, mesmo quando ficava em coma. Para isso eu tive que deixar de trabalhar e de dormir por muito e muito tempo.
 
Valeu a pena. Fui enfermeira, fui filha e fui doméstica - médica também, quando eu precisava "incorporar" a razão, a lógica e a luta pela sobrevivência. Fui cão de guarda, mais que anjo da guarda. Eu estava alerta a tudo e vivia como um robô. Eu faria tudo novamente hoje, apesar de ter tido apagadas minha vida pessoal e profissional por algum tempo.
 
Marcia, lá na Quinta, enquanto sentada num banco, resolveu abaixar o corpo para tirar uma foto bem artística. Quando eu a vi caindo lentamente sobre o encosto do banco e sobre seu braço, fechando os olhos, eu realmente me assustei. Pensei que ela estava desmaiando. Ela levantou o rosto calmamente e me disse: "Leila, estou tentando tirar uma foto artística!". Pensei comigo: "Po, ela bem podia me avisar antes!".
 
Lembrei novamente de minha mãe, a deusa de todos que a conheciam. Uma vez ela deitou no chão e não me respondeu. Eu a chamei e ela fingiu estar desacordada, dizendo a seguir que era brincadeirinha. Eu só a perdoei porque minha mãe era "doida" (mas não louca) e brincalhona, mesmo "doentinha".
 
De alguma forma e por essas razões que só Deus nos mostra, eu vi em Marcia o carisma, a excentricidade e a força espiritual de dona Lola (ou dona Glória).
 
Preciso lembrar disso nos meus dias de hoje...
 
Leila Marinho Lage
Rio, 11 de julho de 2010
Clube da Dona Menô
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